Enquanto o Braille tem ganhado força no cenário educativo, o ensino do soroban ainda ocorre de de forma tímida. Para que o professor do ensino regular aprenda o soroban, é preciso desconstruir a ideia de símbolo associado a uma quantidade e compreender a representação dessa quantidade de maneira concreta, representada pelas contas do soroban que funciona como um tipo de ábaco.
A psicóloga Sabrina Schmitz, 29 anos, conta que sempre estudou em escolas regulares e frequentava a sala de recursos no contraturno, onde aprendeu as técnicas do uso do soroban. Usou o instrumento de cálculo durante todo o ensino fundamental e também quando fez o vestibular. Embora uma de suas professoras tenha aprendido o Braille e o soroban, relatou que os outros docentes ainda tinham algum receio ao ensiná-la. “Meus professores de matemática não sabiam e por isso ficavam preocupados quando iam ensinar algum conteúdo novo, sempre procuravam dar uma maior atenção, explicando para que eu entendesse”, revelou.
Hoje a psicóloga assumiu não mais realizar cálculos pelo soroban, mas acredita ainda manter a agilidade se necessário. Ela também teve o apoio da mãe, que atuava como professora e se especializou em práticas de ensino na área da deficiência visual e apoiava a filha, conferindo em casa os exercícios realizados em sala. Sobre os benefícios do aprendizado da matemática através do soroban, Sabrina concluiu que ele foi o responsável por ter compreendido os conteúdos. “Acredito que tenha sido o soroban que me alfabetizou matematicamente falando”.
Rafael Guidolin, também cego desde criança, concluiu o ensino médio em Curitiba. Hoje com 33 anos reconhece que o soroban seja indispensável também em concursos e vestibulares, pois são nesses momentos que não admitem o uso de calculadora. A partir da Portaria 1010, de maio de 2006, o soroban foi instituído como um recurso educativo específico e imprescindível para a execução de cálculos por alunos com deficiência visual. Segundo a Portaria 1010, o soroban é um contador mecânico adaptado para uso das pessoas com deficiência visual, cuja manipulação depende exclusivamente do raciocínio, domínio e destreza do usuário, diferindo, portanto, da calculadora eletrônica. A partir desta portaria foi permitido Às pessoas com deficiência visual usar o soroban para realizar provas, fazer vestibular, prestar concurso, entre outros. Rafael aprendeu o soroban ainda com 7 anos de idade no Instituto Paranaense de Cegos. “Só usei o soroban até a quarta série e depois relaxei, ficando mais a vontade com a calculadora”, revelou.
O uso do soroban pode ser flexibilizado para ensinar todos os alunos, independente da condição visual e uma das maiores dificuldades é o desconhecimento da técnica por professores que atuam no ensino da matemática. Esse fato desmotivou Rafael a prosseguir. Foi “por falta de conhecimento dos professores que deixei de usar o soroban, pois eles ficavam nervosos por não saber como dar aula para cego”, disse.
O ministério da Educação, por meio da Secretaria de Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) disponibiliza um manual de técnicas operatórias, abordando as quatro principais técnicas para o ensino do soroban. é importante, também, que os professores procurem cursos com profissionais qualificados, evitando fontes desconhecidas e não oficiais. Há muitos materiais bons de consulta na internet, embora outros mostrem de maneira superficial e confusa como manipular o instrumento.
* Luciane Molina é pedagoga e pessoa com deficiência visual. Atua com educação inclusiva e formação de professores no Vale do Paraíba e Litoral Norte de SP.